Por PORAKÊ MUNDURUKU*
As bases do sistema colonial, desde a antiguidade, tem estado intimamente relacionadas à escravidão. O colonizador impõe, por meio da catequese (domínio ideológico) e da violência (coerção física), seu domínio para explorar e saquear outros povos, sendo a escravidão a forma mais óbvia e abjeta de impor tal dominação. Tem sido assim pelo menos desde os antigos impérios mesopotâmicos, passando pelas cidades-estados gregas, até o tráfico transatlântico de pessoas capturadas no continente africano para serem submetidas à escravidão aqui, em Abya Yala.
No entanto, no imaginário popular, na mídia e nas aulas de história a prática da escravidão costuma estar relacionada exclusivamente ao tráfico transatlântico, quase sempre invisibilizando a escravidão dos Povos Nativos, tão importante para a formação do estado brasileiro quando a escravidão de pessoas negras.
Sim, é verdade que africanos e seus descendentes foram submetidos à escravidão por mais de três séculos nos territórios que viriam a formar o Brasil e sofrem as consequências dessa violência indescritível até a atualidade. Mas é igualmente verdadeiro que nós, indígenas, fomos os primeiros a ser escravizados pelo colonizador europeu e fomos, também, sua principal força de trabalho até meados do século XVII, quando, só então, o número de escravizados de origem africana superou o de escravizados nativos.
E, apesar da proibição formal da escravidão indígena em meados do século XVIII, por decreto do infame Marquês de Pombal, que supostamente proibiu apenas a posse privada de escravizados indígenas, manteve-se o "direito" do Estado colonial português de submeter pessoas indígenas ao trabalho compulsório, um "direito" herdado pelo Estado colonial brasileiro, que continuou escravizando pessoas indígenas pelos séculos seguintes. Ao ponto que, em pleno século XX, foi criado o Serviço de Proteção aos Índios e Localização dos Trabalhadores Nacionais (SPILTN), que repetiu as mesmas estratégias da escravidão colonial, promovendo políticas públicas para “civilizar” pessoas indígenas para o trabalho, uma lógica formalmente mantida pelo menos até 1967.
* PORAKÊ MUNDURUKU - Escritor. Contador de estórias e histórias. Pesquisador associado à @pavicpesquisadores. Articulador no Pará da @kabiadip. Coordenador do @teko.artivismo.
Yorumlar